quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Indisponibilidade

Rob Oele, Mysterious green device with rusty head, 2004

Caminho apoiada numa certeza que dá pelo teu nome. Se somos aquilo que sentimos, aquilo que sinto é absoluto e concreto, mesmo quando o chão é feito de areia e os pés me fogem, desarticulados. O meu caminho és tu em todas as direcções, mesmo naquelas em que me imaginas secreta, omissa ou apenas silenciosa. O que sinto e que te escrevo é o meu caminho definido pelos contornos que o Amor lhe desenha todos os dias, desde o dia que nascemos lado a lado. Pudesse eu ser mais concreta e definida para que me sentisses por inteiro neste desígnio que assumo tão completamente... Perdoa-me pela falta de palavras que me expliquem mais consistentemente. Perdoa o que falho em dizer, mas acredita na grandeza do que sinto sem limites de espaço e tempo, porque eu sou onde estiveres comigo, em qualquer parte ou mesmo num não-lugar.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Mundo insuficiente

Paulo Calafate, Canon G10 series, 2009
Não acho que o mundo tenha sido feito para nós. Não foi. Importa navegar pelo tamanho das ondas e não esperar o que procuramos, importa partir do nosso lugar e encontrar ilhas para sentir e querer mais do que o mundo nos mostar. O mundo não foi feito para nós. Importa, no peito, a coragem rumo à dor que houver para vir e dar sentido à viagem do que em nós temos por descobrir. O mundo não foi feito para nós. O mundo é feito por tudo o que somos capazes de alcançar, pelas ondas que persistem como vontade de navegar. Importa, antes de morrer, saber que tocámos quem nos tocou, que agarrámos o que sentimos e quisemos segurar. Partir em paz é ter, na alma, uma paixão alimentada por Amor. Viver é esculpir o mundo à nossa medida, dar-lhe a forma dessa paixão que nos segura, lado a lado, num imenso mar que somos nós numa só.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Já te volto, Amor

Roan Kneppen, f.o.m.-sandbox-538

Hoje de manhã tropecei num dia cheio de cores e fiz estragos por toda a parte onde passei. Os lençóis estão manchados de tons alegres e vivos como a intensidade dos nossos corpos um no outro. O tapete deixou de ser monótono, porque a cor explodiu sobre ele de uma forma rebelde e transformou-o num organismo quase vivo e cheio de opinião, acho até que andou a passear pela casa enquanto nós, pele na pele, viajávamos uma na outra. Pelo chão, manchas de tinta de cores diferentes desenham contornos que imagino serem os teus passos misturados com os meus, numa abstração perfeita que condiz harmoniosamente com a sintonia de duas pessoas que foram Uma durante toda a noite. As paredes desapareceram e deram lugar a quadros que nos observam e interagem numa espontaneinade surpreendente e impossível de descrever. Por todo o lado tudo é cor, a casa, o carro, as minhas mãos, os meus olhos nos teus. Esta noite acordámos todas as cores do mundo e pintámos um dia bonito por todo o lado. O Amor é esta forma abstracta de te procurar e de te encontrar de surpresa aqui, agora e daqui a um bocadinho, ou mais logo, ou ontem... amanhã, sempre. O Amor é esta capacidade de rir, escrever cartas cheias de histórias e tropeçar em tintas de cores diferentes sem medo de sujar o chão.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Paixão da alma

Lester Weiss, Cracked glass, bus in junk yard, Barstow, Ca., 2004

Sinto os olhos em estilhaços e a alma um pouco desfocada e vascilante, debaixo de vento forte. Passou por mim uma imensa tempestade. Não caí. Estou agarrada a uma ideia que é, no fundo, o meu sentido de existência. Uma ideia que me salva e que me organiza, mesmo quando os olhos se partem em pedaços e se espalham pelo chão. Não sei desistir da ideia do Amor. Não desisto dessa paixão que me alinha os dias desde que te encontrei. Não desisto de acreditar porque sei que existes e, sabendo que és, eu existo para ser contigo. Trago em mim esta ideia, como parte de mim mesma, a segurar-me o corpo, a alma e o coração contra a fúria das tempestades. Pode alguém desistir de uma ideia que nos materializa o sentido da vida? E se o Amor é a vida, pode alguém desistir da ideia apaixonada de amar e ser amado? Não. Não imagino o amor sem esse estado de paixão pela vida, essa urgência por quem se ama em estado de permanência no pensamento. Se é demais, não sei. O que sei é que a ideia apaixonada do amor que te tenho é sangue e oxigénio que me anima e me torna consistente. Desistir de viver apaixonadamente esta ideia não é possível.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Recados

Paulo Calafate, Photographing Everything Series, 2010

Quase sem dar por nada, encontrei um recado num bolso que nunca reparo que existe. E, porque hoje reparei, procurei-lhe sentido e encontrei. Era um recado simples, algo que escrevi para me surpreender a mim mesma no futuro. Fui à procura de outros bolsos de roupa e sacos e neles encontrei notas e apontamentos que falam de ti, de coisas soltas nossas, de instantes únicos e impressões de alma. Há pedaços nossos em todos os compartimentos, gavetas e bolsos interiores. Fui escrevendo em toda a parte para depois lembrar. Parece que escondi para descobrir e recordar. Não me lembro de o ter feito, mas há recados de nós por todo lado, de ontem, de hoje, e se procurar bem, de amanhã também. Lembro-me do que está escrito, passado, presente e futuro. Percebes agora porque passo tantas noites sem dormir? Para espalhar recados nossos, mensagens importantes sobre o Amor que nos viu nascer e se escreve a si mesmo nos cantos e recantos da casa onde somos incondicionalmente sempre.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

No fundo do mar

Patrick Smith, Point Reyes Light, 2009

Hoje espreitei o fundo do mar e senti-me pobre por viver à superfície. Aqui, sentada no conforto e abrigada da chuva, desejei ser peixe das profundezas, irresistivelmente luminoso numa escuridão sem fim, apenas quebrada pela vida desses reflexos de luz. Hoje deixei-me seduzir por esse mundo de diferença, onde tudo é ao contrário do que aqui existe ao sol. Porque a diferença seduz e torna tudo mais encantador. Foi assim que te vi pela primeira vez, como se fosses o fundo mar, onde eu nunca fui mas onde presssinto a vertigem e a sedução hipnótica da diferença, do desconhecido. E assim te vejo hoje quando nem suspeitas que estou a olhar. Gosto tanto da forma como me encantas sem saberes, nesses instantes em que te visito no fundo do mar.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Folhear o chão


Barry Green, Japanese Maple in Autumn 3, 2006

Hoje, quando acordei, havia um enorme silêncio no mundo inteiro e eu estranhei mas não soube explicar. Quando olhei à minha volta, por todo o chão do quarto havia folhas secas, caídas, imóveis à espera de vento que as levasse. Estranhei mas não soube explicar. As paredes continuavam brancas, as portas abertas e havia luz tímida e indefinida a entrar pela janela, mas, no quarto, apenas um chão de folhas se percebia, até a cama tinha desaparecido. Estranhei mas não soube explicar. Procurei-te um beijo como todas as manhãs mas encontrei a tua ausência como almofada. Estranhei e, só então, percebi o vazio que me visita quando o Amor não está em casa. Percebi que, durante a noite, coleccionei os milhares de folhas secas que jazem pelo chão, para escrever nelas frases soltas de histórias nossas, memórias, fragmentos de momentos que nos estão debaixo da pele. Escrevi também o teu e o meu nome em todas elas e não me lembro de ter dormido realmente. Quero mostrar-te cada uma das folhas quando chegares, para que acredites que me fazes falta, que a tua ausência é um silêncio imposto ao mundo, que as saudades são folhas mortas cheias de histórias de vida interior que transbordam o coração. Fica sempre comigo, mesmo que a vida se nos acabe fica em mim como tu, em mim, estás sempre.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Vivacidade

Bob Reynolds, The Colors of the Fall series

E por entre o que caminhamos, em cima e debaixo do chão, a vida impõe-se na sua espontaneidade florida, indiferente ao nosso humor, cheia de sentido. Quase milagrosamente passamos de um estado ao outro, de baixo para cima, na contemplação dessa força maior e inexplicável. Porque a vida é vontade e a vontade leva-nos onde quisermos se quisermos, de facto, lá chegar. Porque a vida é acreditar numa ideia e cultivá-la resistente, amadurecê-la e crescer com ela e por aquilo que nos é essencial. Ideias simples e identificantes de centralidade e pertinência, como o Amor. Esgota-se-nos a vida no dia em que perdermos a ideia de centro e divagarmos na secundaridade de linhas concêntricas. Como eu, já pensaste nisso certamente, por isso caminhamos de mão dada o permanente milagre da vida de um amor correspondido.

domingo, 12 de setembro de 2010

Formas condicionais

Jêrome Le Dorze, Vases series, 2010

Se eu pudesse punha-te dentro de um frasquinho portátil e levava-te comigo para todo o lado, se tu quisésses, claro. Se fosse possível tu e eu seríamos indivisíveis e assim não haveria horas mortas entre nós. Se tu quisésses, claro. Se pudesse ser, seríamos corpo e alma uma da outra e ocuparíamos exactamente o mesmo espaço visível e invisível, se tu quisésses, claro... Se eu pudesse abreviava estes condicionais que nos dividem em duas pessoas distintas e, sendo duas, seríamos uma. Se tu quisésses, claro. Temos o sempre do nosso lado e o Amor para vencer as condições do humanamente impossível.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Festejar-te

Rob Oele, 2008

E os anos passam e nós por eles navegando. Hoje, que é o teu dia, quero chegar, partir e voltar sucessivamente, numa viagem sem fim, a ti e contigo e desejar que passes por muitos anos e que eu navegue no mesmo mar, ao sabor do mesmo vento que nos empurra o coração na aventura de um amor infinito. Seguimos em frente, amarradas pela mesma corda robusta, cujo nó não desata porque, na nossa viagem, o sempre é um destino. PARABÉNS!

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Mais e mais de perto

Rob Oele, A look at the sea, 2004
Por um instante, deixa-te ficar aqui, sentada ao meu lado, sem fazer nada, como se o tempo não existisse para além deste momento em que eu desenho a verdadeira extensão do mar com o horizonte de olhos que não alcançam mais do que o preciso lugar que ocupas dentro e fora do corpo. Não te mexas, deixa-te ficar assim, quase imóvel para além do respirar, para que tudo seja exacto, feito por medida, a nossa medida. Deixa-te estar, descansa por um instante e imagina os mil mundos que estão para além deste nosso ponto de fuga. Imagina tudo quanto existe e mais aquilo que podemos descobrir. Imagina tudo isso e mais aquilo que não cabe na nossa imaginação. É muito, não é? Respira fundo e anda, levanta-te, vem daí comigo até onde podermos ir com o desejo de infinito no coração e o Amor a puxar-nos pela mão. Meu Amor, nunca te canses de ir até longe comigo.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Recapitulando


Anabark, Braços ao vento (AGO2010)
No outro dia, enquanto tu não estavas à distancia de um abraço e eu ficava suspensa no contar dos dias, entrei no carro, no fim do entardecer, ausente do mundo a minha volta, e deixei-me surpreender por um pedaço de sol e gratidão da natureza reflectidos no meu retrovisor. Fiquei quieta com receio de desmaterializar o momento que me espreitava do lado de fora do vidro traseiro e, só a custo, acordei a ideia e recuperei o gesto para poder guardar a imagem dessa liberdade e sintonia que só existem na natureza e nos afortunados que experimentaram o amor pleno. Quando penso em ti, consigo definir dois ou três conceitos primordiais que nos distinguem enquanto espécie humana: amor, felicidade e vida. Não por lógica ou pensamento inteligente, mas porque sei que, contigo, aprendi coisas essenciais e porque, hoje, sou maior, muito mais e melhor graças ao que consegui aprender desde o momento que nos descobrimos uma na outra. E os dois ou três conceitos que julgo saber definir acontecem inseparáveis, vivo-os num só, porque se implicam reciprocamente. A vida não existe sem Amor e quem não ama não pode ser uma pessoa feliz. Porque o Amor é o princípio de tudo e o infinito da vida. Porque a felicidade é o estado que se alcança quando percebemos a importância dos braços que nos amam à nossa espera. Porque nada vale a pena sem esse sentido de dádiva desinteressada e livre. Porque a vida é, acima de tudo, um acto de amor. Não se vive em desertos áridos e num coração vazio e moribundo cabem todas as pessoas infelizes do mundo. És em mim esta clarividência das coisas.