sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Ponto de situação

Anabark, Ideias Fixas (AGO 2013)

Gostava mesmo muito de estar enganada como tu achas sempre que estou. Gostava de não ter razão nenhuma e de ser surpreendida por melhor razão!...

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

"Que nada nos limite..."

Iwona Drozda-Sibeijn

"Que nada nos limite, que nada nos defina, que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância, já que viver é ser livre. Porque alguém disse, e eu concordo, que o tempo cura, que a mágoa passa, que a decepção não mata, e que a vida sempre, sempre continua." 
 Simone de Beauvoir

terça-feira, 20 de agosto de 2013

"Apaga-me os olhos..."

Bence Bakonyi

"Apaga-me os olhos, ainda posso ver-te. Tranca-me os ouvidos, ainda posso ouvir-te, e sem pés posso ainda ir para ti, e sem boca posso ainda invocar-te. Quebra-me os ossos, e posso apertar-te com o coração como com a mão, tapa-me o coração, e o cérebro baterá, e se me deitares fogo ao cérebro, hei-de continuar a trazer-te no sangue."
Rainer Marie Rilke

domingo, 18 de agosto de 2013

Coração inteligente

Shihya Kowatari,Transparent 1, 2012

Com toda a transparência como água que é vida, assim te assumo em mim. E querendo-te, quero-te com a mesma relevância, no bom e no mau que tiver de ser. De outra forma não seria inteligente porque não seria verdadeiro e eu dispenso mentiras no sentir. Conheço-te bem, sei o que podes, o que queres e o que sonhas ser, e tu conheces-me também, sabes o que sou e o que de ti não desisto mesmo quando me chegas no gelo dos dias frios. Esta inteligência que temos uma da outra distingue-nos no mundo depois de 'nós', porque há nela uma incondicionalidade que, ainda que negada, sobrevive ao tempo em que 'nós' não existimos. Amando por inteiro aprendi que Amor é coisa de pessoas inteligentes e corajosas. Os outros, os que não entendem o sentir nem confiam no coração, desistem a meio caminho. É preciso ser inteligente para perceber que encontrámos o Amor e é preciso ser corajoso para reconhecer o seu valor e fazê-lo crescer incondicional no que as horas, inevitavelmente, nos envelhecem. Os outros, por muitas vezes que se apaixonem, confundem e confundem-se, amam apenas a ideia de Amor e vão procurar a vida inteira o Amor verdadeiro que nunca chegarão a reconhecer. E morrerão como sempre viveram, desencontrados em si mesmos.

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Sem tempo contado

Dario Puggion

Sabes que minto quando te reclamo 'cinco segundos'. E já não tenho idade para te mentir. Sabes tão bem quanto eu que 'cinco segundos' em nós foram sempre muitas horas de dias de desassossego e noites incendiadas. A única inocência dos 'cinco segundos' que proponho é porque sei que será sempre assim para toda a vida. Apenas contigo, 'sem remédio', de corpo e alma fundidos. O estado de urgência que não envelhece em nós é a nossa eternidade indesmentível. Por ser tão verdade não haverá, nunca, mais válido compromisso do que aquele que prevalece debaixo da pele sem tempo, por muitas voltas que dê, sem 'nós', o mundo. Já não tenho idade para mentir-me.

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Apontamentos

Kristina Lerner, Isolation Series

Gosto de te ouvir falar, das coisas que dizes sem querer dizer, dos pensamentos soltos que completas como quem escreve palavras novas num caderno de apontamentos. Gosto que te oiças no que aprendes, no que sentes e no que és livre de dizer. Gosto do que me ouves no que te reconheces e sorris. Gosto do que te conheço e que ninguém te descobriu ainda. E gosto do que a tua pele me diz. Gosto do que te encontro sem te dares conta quando me engano. Sei quem és e o que podes ser ainda. Não gosto do que te perdes no esforço de controle como quem anda, por dentro, desencontrada, porque não gosto da dúvida disfarçada de certeza da boca para fora. Gosto do sonho em que és tu por inteiro sem que o tempo te magoe essa força de liberdade absoluta. Conheço o que não te conheces e gosto do que és capaz de te descobrir. Não gosto quando não te permites ser apenas tu, nem mais nem menos.

sábado, 10 de agosto de 2013

A Escolha

Alessandro Puccinelli, In Between

Se pudesse escolher outra vida, escolheria a que tenho, mesmo sabendo da dor em que nela morri mais do que uma vez, se fosse esse o preço a pagar para te ter e para que o instante de deslumbramento em que, um dia, acontecemos permanecesse intacto até à hora da nossa morte. Porque me arrependo do abraço que não te dei e que talvez esperasses de coração nas mãos como eu sempre esperei o teu em cada segundo. Porque me arrependo de todos os beijos que não te roubei nos dias em que os lábios nos secavam por falar demais da boca para fora. Da alma para dentro ficaram demasiados beijos e abraços que, hoje, me fazem falta com a mesma urgência de ontem. Arrependo-me do tudo que não fiz, do amor que não te disse e não te ouvi, e lamento as horas que perdi calada, desencontrada de mim em ti. E, acima de tudo, arrependo-me do momento em que fiquei surda à voz do coração, emaranhada na razão que julguei que tinha, porque sei que enlouqueci no dia em que troquei o coração pela minha razão contra a tua, porque sem ti descubro que ter razão e o coração frio é a morte. E eu escolho a vida, amar-te como sempre amei, por instinto e sem razão nenhuma.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Hoje sei

Andrey Belkov

Não fomos por acaso e não somos por acaso no que, hoje, nos sentimos ainda na pele e para além dela. Somos mais do que uma história que sobrevive ao tempo e ao teu desencantamento. E se eu, hoje, moro no teu livro de desventuras, tu moras na minha alma e nela te seguro nos dias, nos anos, nas vidas que me sobrarem. ‘Sempre’ é mais do que uma intenção, é a minha forma de estar contigo, porque gosto infinitamente do que és em mim sem tempo e a vida é o que abraçamos incondicionalmente com a alma e o contrário disso é a morte. Hoje sei que não há porto que me abrigue o desassossego infinito em que te revisito e viajo. Desassossegam-me coisas simples como o brilho dos teus olhos escuros quando amas apaixonadamente. Porque há uma luz que só eu conheço em ti e tu em mim, antes e depois de nós. Hoje sei que, em mim, nenhuma tempestade é mais forte do que o Amor. Só a tua falta de fé me condena ao passado.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Indisponibilidade

J.M. Barclay

"...Agora vê que há momentos em que é impossível o amor. É impossível abrir o coração quando nem se sabe onde ele anda. É impossível pensar em dar, ou mesmo em receber, quando há apenas cansaço. Quando a palavra esforço entra na equação. (...) Agora ela olha para trás e acha que, quando duas pessoas se apaixonam e começam uma relação com uma disponibilidade completamente diferente para o amor, uma das duas vai herdar um cansaço que não é o seu. Sabe agora que o amor pode muita coisa mas não pode tudo. Pode adiar o cepticismo, pode contornar a sensação de fracasso, pode entusiasmar-se durante uns tempos, mas se começar cansado, vai acabar cansado.(...) Porque, agora, sabe que sim, o amor também é uma questão de disponibilidade. Que nem sempre se tem."

Patrícia Motta Veiga

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Sem passado II

Autor desconhecido

A segunda vez que morri, fui estrangulada pela tua partida magoada e sem regresso e não paro de morrer no nada em que nos encontramos desencontradas em coisas que não queremos e coisas que não sabemos por no lugar. A dor que te atrapalha ainda, tornei-a minha dor também. No passado ficou tudo e esse tudo é muito por cumprir e, por isso, morro todos os dias pela oportunidade que não tive de curar-te em Amor. Guardo em mim o abraço interrompido e sinto em ti o passado mal resolvido e o medo das saudades que não te morreram. A minha morte é a tua ausência nos meus braços. A tua vida é querer outros braços que não os meus. O meu passado é a vontade de perdão do Amor. O teu passado é a dor de amor eternamente revisitada. O presente, por comparação, é nada.

terça-feira, 6 de agosto de 2013

Sem passado I

Autor desconhecido

Já adoeci vezes sem conta de saudades e até delas morri duas vezes. Da primeira vez morri de copo vazio na mão quando tu partiste com o teu meio cheio. E o vazio tomou a forma do que me faltavas, desse amor que não se esquece, não se apaga e não chega ao fim. E, vazio do que não te tinha mas cheio desse infinito e do teu lugar em mim, o meu copo não quebrou. E tu voltaste-me um dia. E eu limpei a dor em que morri na tua ausência e abracei-te sem sombras no passado, abracei-te como da primeira vez em nós e, nesse mesmo instante, o Amor curou-me as cicatrizes e renasci contigo num presente a construir. Abracei-te tudo sem a dor do passado a pesar-me nos meus braços, senti a tua força segurar-me em cada passo e o Amor aninhar-nos para além da dor das saudades em que fui juntando todos os pedaços de nós que me ficaram entre a carne e a alma. Porque o teu sorriso vence-me, porque o brilho dos teus olhos no encontro dos meus cura, porque és TU e tu serás sempre um beijo infinito nos meus lábios incondicionais.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Demais

Geert Goiris, White

Amei demais, pensava eu para me explicar o tombo e a minha morte depois de ti. Amei demais, desculpava-me eu para encontrar paredes onde me agarrar para levantar-me do chão. E em todas as paredes havia sombras e nenhum sol com calor suficiente. E as saudades dos anos por onde passei contigo encontrei-as espalhadas em todas as ruas e em todos os sítios onde não consegui voltar porque tu e eu, para sempre, ali moramos. Amei demais, julgava eu, e tudo o que dei perdi por amar demasiado. Mas enganei-me. Depois de tantos anos à procura de ti e de mim, não pode ter sido por amar demais que nos perdemos, porque o Amor não tem medida, é a proporção divina. Demais foi a nossa imperfeição humana que, tão estupidamente, nos tornou pequenas para abraçar esse Amor que nos chora ainda por ser, em ti, distante e, em mim, tão infinito. Amar demais é um pensamento banal e nós, ainda que imperfeitas, nunca seremos banais uma na outra.

domingo, 4 de agosto de 2013

Milhares de razões

Britta Jaschinski

Gostava tanto de poder dizer que te encontrei. Gostava tanto de dizer que passei por ti entre milhares de gentes e os meus olhos te encontraram e em ti ficaram. Gostava de ter passado por ti e atrasado o passo para poder guardar-te em pormenores infímos, para hoje ter mais para recordar-te. Gostava tanto de ter sido eu a encontrar-te na vida e não fui. Foste tu quem me encontrou. E essa é a minha eterna dívida contigo que nunca poderei pagar, porque soubeste encontrar-me, eu que te procurei tanto e por todo o lado e não consegui. Depois 'foi fácil' ficares em mim para sempre e 'sem remédio'. Ainda hoje te encontro o sorriso da primeira vez que nos vimos. E, às vezes, quando estás distraìda e baixas a guarda, os teus olhos incendeiam-me na mesma ansiedade dos tempos em que fomos infinitas. Tenho milhares de razões para encontrar-te e sentir-te hoje em mim, as mesmas que, um dia, nos fizeram para sempre. Nenhuma delas mudou, nenhuma delas esqueci.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Floresta

Gerhard Richter

Lá longe havia pontes que atravessávamos vezes sem conta para nos encontrármos sempre a meio caminho. Nesse longe havia forças combinadas que nunca nos abandonavam, mesmo com ventos fortes nos nossos corpos desabrigados. E andávamos depressa e nunca nos cansávamos. E nunca caímos da vontade de sermos infinitas porque nunca soubémos ser, uma na outra, de outra maneira. Lá longe nunca nenhuma tempestade nos deteve porque sabíamos sobreviver escutando o coração. E não sabíamos desistir do que sentíamos porque nos ouvíamos com alma e tínhamos sede do que dizíamos com o olhar. Este tudo eu sei de cor e ainda sou eu, ainda é a melhor parte de mim. O resto são apenas árvores arrancadas do chão nos dias de tempestade. As pontes desapareceram mas a floresta mantém-se de pé, viva e renovada.