quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

À beira de 2009

Maaike Huizer, January 1st - Let's play

Está quase e é inevitável. É ver o que acontece...
FELIZ ANO NOVO a todos dentro e fora do 'Copo...' Que 2009 nos faça mais fortes, mais felizes e melhores como seres humanos.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Prémios Dardo


Obrigada Brokenangel e Angell pela distinção atribuída a este espaço, com um prémio que tem como objectivo "...distinguir blogues que contribuem de forma significativa para o enriquecimento da cultura virtual, através da veiculação de valores culturais, éticos, literários, pessoais… premiando os blogueiros que demonstram a sua criatividade através do pensamento vivo e através das formas de comunicação que utilizam para o expressar...."

Aqui fica o selo do prémio, mas não a escolha de outros blogs para premiar, porque é difícil escolher e porque há demasiadas coisas boas para escolher só algumas.

Lembrança

Christoph Joosten, 50 mm shots, 2007

Lembrei-me de um anel que nos segurasse a força de para sempre e mais um dia. Lembrei-me dessa força imparável que nos fez convergir num centro inamovível. Lembrei-me da resistência dos metais preciosos, da velocidade de um cometa ou da altura de uma montanha. Lembrei-me de tanta coisa, meu amor. E depois ficou-me a ideia obcessiva de uma argola em ferro, sem princípio nem fim, para definir a ideia em que eu habito o nós.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Do outro lado do inverno

Yannis Logiotatides, Drops on window, 2003

Enquanto a chuva desce e o abraço em que descansamos nos aquece a noite do frio em que se desfiou o dia, lembro-te a ti e a mim sem o abrigo que hoje somos. Aqui, por detrás do vidro da janela que nos separa da tarde invernosa, sabe bem recordar as muitas voltas que o mundo deu até nos encontrar num mesmo passo, num mesmo tempo, numa mesma história. Aqui, abrigadas dos dias invernosos em que derivámos na dôr, à margem uma da outra, celebramos uma fé maior do que a vida, porque ela é a própria vida quando tudo perde sentido longe do Amor. O fogo, que é como sempre foi, vive em tons escaldantes numa chama alta. Aqui não temos frio, a roupa sobra-nos despida da pele incendiada por este algo tão imenso e quanto impalpável que sentimos por dentro e nos estremece o corpo todo. Ontem já éramos tudo isto, mesmo quando, longe, chorámos o que nos julgámos impossível. Hoje somos mais e amanhã, recordando hoje, seremos mais ainda. Somos infinitas, porque o provámos a nós mesmas e aprendemos a razão desse infinito. Porque, se dúvidas houvesse, bastaria olhar para trás e repararmos na nossa sombra escura e arrastada nos tempos de abandono. Porque tu e eu temos uma razão de ser, aqui, do mesmo lado. Do outro lado do inverno, um mundo de vento, chuva e nevoeiro sem nós.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

O amor no calendário

Matthew Jellings, Ice Leaf

Quase a fechar o ano e a celebrar, pela terceira vez, o dia em que a vida nos começou um fogo diferente ao nosso encontro, sorrio aos três anos que nos juntam e percorro todas as esquinas do pensamento, revivendo os caminhos que andámos para estarmos aqui, à distância de um beijo a qualquer hora do dia. Temos história. Temos tanto para contar, vivemos tanto para aqui chegar. Temos muitas histórias, sobramos em intensidade no tanto que já vivemos em tão pouco tempo. Somos o exemplo de que de nada serve lutar contra a vontade que a alma segura a ferro e fogo. Porque o coração tem vida própria, porque aos dois corações que se reconhecem na primeira hora une a promessa de sempre. Somos esse inexplicável e esse infinito que os outros nos reconhecem no olhar. Porque brilhamos por dentro e há uma luz que nos encaminha os dias, um a um, cada vez mais perto do que queremos cumprir - o nosso sempre é um estado de alma absoluto, sem sombras nem dúvidas.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

Boas Festas

Jim Larkey, Christmas Tree, 2004

A todos quantos por aqui passam e se demoram e aos outros que, nunca passando por dentro de copos escritos, desejam e procuram ser felizes votos de FELIZ NATAL.
Que, esta noite, haja presentes sem preço, tão raros e únicos quanto os desejos de alma de cada um de nós. Nada do que é realmente importante está à venda em lojas...
Um abraço de boas festas!
Always & U-Turn

sábado, 20 de dezembro de 2008

Pelos cantos

Anabark, Pelos cantos, SET08


Nos cantos, pela casa, espreitam partes de nós desengonçadas. Reparamos todos os dias no que temos de arrumar e, por vezes, arranjamos tempo para deitar fora e desocupar o espaço que nos falta. Outras vezes acostumamo-nos e deixamos estar desarrumado. Porque nos doi o corpo pelas horas acordado, porque nos doi a cabeça de tanto pensar. Nos cantos, pela rua, sobram pedras abandonadas. Tropeçamos, passo a passo, nas que não conseguimos evitar. Não sabemos de onde vêm, mas apenas que ali estão à espera da gente que passa distraída, de olhos mais alto do que o chão. Os dias estão muito longe do Natal. Voltar a casa é acreditar que o que nos apetece vai acontecer. E corremos mais depressa do que as pernas podem. Todos os lugares do mundo são não-lugares longe da casa onde nos cumprimos. Pelos cantos, vão estando coisas soltas por arrumar, que nos sabemos, muito bem, onde as encontrar.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Descrição

Jakob Ehrensvärd, Exploding sugar cubes

A vida acontece acontece mais depressa do que a dor tantas vezes incurável. A vida passa sem darmos conta que envelhecemos e da irreversibilidade do que vamos ficando. Aqui e ali juntamos estilhaços úteis de uma moldura que nos configura a existência, com mais ou menos sentido, dependendo do empenho que lhe dedicamos. E ainda que tudo se transforme, às vezes perdemos o jeito de criar de novo. E nesses momentos, salva-nos o espaço interior que nos faz sentir inteiros, unos e cristalinos, o que sentimos só nosso incondicionalmente, ou nada do resto faria sentido. E só o Amor assim se descreve. Nada em mim é mais verdadeiro do que o laço que me faz viver-te sem descanso porque não sei distinguir-me de ti. No que me une a ti não envelheço, recrio-me e transformo-me. Aprendo a vida do princípio, porque não sei nada e quero muito aprender sobre todas as coisas que somos sem saber. De ti nasce-me a vontade de ser para sempre porque, à medida que o tempo passa, seja qual for a estação do ano, confirmo que não sei separar-me de ti. Só o Amor assim se descreve, neste olhar para dentro e ver-te aqui, para além da pele, onde as mãos não tocam, aqui no mais intímo e autêntico do que sou e tu és num todo. Só o Amor assim se descreve, a clareza de ser contigo, indivisível.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Pedras

Frank Loehner, Cutting the stone - raw material, 2005

Pedra sobre pedra crescem muros.
Dentro de paredes há um mundo inteiro retraído,
de paisagens retalhadas

pelos muros que se erguem
em florestas de pedra descontroladas.

Debaixo das pedras vivem escorpiões assustados.
Pedra sobre pedra deixamos acontecer
muros mais altos do que altura segura para saltar.
Que nos falte o cimento
e nos sobre a força para os derrubar.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Chega-te a mim

Wenche Aune, Winter 06, 2007

E havia fogo sepultado no gelo das horas vazias porque a chama permanece na alma tão naturalmente como a fome e a sede habitam o corpo vivo. E o gelo nunca fica porque se transforma em água que mata a sede ou que aquece o estômago à procura de conforto. Longe de nós pouco existe, a consistência perde-se e as coisas derivam numa lógica imprópria porque incompreensível. Até as palavras que nos abandonam procuram formas de nos alcançar com uma urgência incontornável que, por vezes, não sabemos acompanhar. Erros de percepção são reflexos no espelho, imagens imperfeitas que se sustentam numa inversão da realidade. Descubro-te lentamente descubrindo-me. Os dias de tempestade são apenas nuvens num céu de azul infinito. Por cima das nuvens o sol não dorme. A luz permanece num plano absoluto de imortalidade. Assim nos sinto eu, assim nos vivo sem equívoco do que te sinto em mim. Porque há um lume aceso em nós como o céu luminoso e sem limites para além das nuvens.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Dias úteis

Jakob Ehrensvärd, Conclusion, 2006

Nos dias em que nos são úteis, sinto o mundo encolher e tornar-se tão pequenino que, às vezes, chega a desaparecer. Outras vezes, vai ficando tão difuso e indefinido que se torna, simplesmente, invisível. Nesses dias raros, porque únicos para nós, a matéria que nos funde é de uma outra grandeza e consistência que só estremece perante uma catástrofe natural. E somos sem tempo e sem fim encostadas uma à outra, a ordem de todas as coisas, mesmo daquelas que ainda não são. Tudo quanto existe perde centralidade e a pertinência relativiza-se numa inversão voluntária de prioridades. Tudo quanto existe somos nós, o princípio e o fim de tudo e não o mundo que nos sobra. Nos dias que nos são úteis, o universo deixa de ser uma ideia da física e da matemática combinadas. Nos dias que nos são úteis, somos o infinito e todas as combinações e probabilidades de existência.

sábado, 29 de novembro de 2008

Meteorologia

Zenmatt, Snow slidding down, 2006

O frio que, lá fora, despe as árvores até à próxima estação e pinta o chão de folhas em tons de Outona quase Inverno, aconchega-nos num abraço que queremos sempre mais quente e mais demorado. O calor que procuramos no corpo uma da outra prolonga-nos a vida numa estação única e a certeza da escolha - o Amor escolheu-nos e nós escolhemos o Amor. Sinto, no abraço que nos recolhe ao fim do dia, a essência desse encontro feliz que nos devolve a vida que antes de 'nós' só existiu enquanto promessa. Sinto, no beijo em que nos damos e recebemos por inteiro, a alma e o corpo encontrados e a eternidade que ouvi dizer, sem acreditar, tantas vezes antes de ti. Hoje sei que o Inverno é apenas uma estação do ano e que a lã das mantas que nos cobre, embrulhadas uma na outra, não nos deixa passar frio. E que depois do Inverno virá a Primavera e assim sucessivamente. Tenho sorte, porque, às vezes, a vida é um deserto de gelo onde o sonho esmorece e morre, porque ouço dizer a alguns que o Verão é uma apenas promessa. Eu acredito no calor que me aninha todo o ano. Tenho-te a ti, não dependo da meteorologia.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Sem lugar

Adrian Reilly, The Chimneys of Griffithstown, 2006

Recordo a rua que nos encontrou ou em que nos encontrámos pela primeira vez. Já não existo no mesmo sítio e faltam-te poucos dias para deixares a vizinhança que me tem ausente. Pouco importa quando conquistámos um mundo depois disso. Para trás ficam instantes feitos de primeiros momentos, coisas nossas que não morrem no tempo. Para trás ficam apenas lugares que continuam nossos para além do espaço que ocupam. Nada se perde numa partida de mãos cheias. Os dias que aí vêm são o resto da nossa vida e será sempre assim. Tu e eu existimos em todos os cantos do mundo, tu e eu não temos nem tamanho nem distância porque não existe medida quantificável que nos contenha no que vivemos por debaixo da pele que nos embrulha numa só. Os dias que aí vêm são mares infinitos por onde nos navegamos de corpo e alma. O lugar que nos acolhe é a nossa certeza de ser sempre sem limite e incondicionalmente. A rua que, um dia, nos encontrou continua no mesmo sítio, mas nós, que deixámos de por lá passar, existimos muito para além dessa recordação do princípio. Somos os dias por vir e a esperança de que o tempo não tenha fim. Recordo a rua pelo prazer eterno de te revisitar ao meu encontro pela primeira vez. Será sempre assim.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Na terra inteira

Adrian Reilly, Love like Blood, 2007

Está escrito em todo o lado, nas paredes, nos muros, no chão, o que corpo reconhece infinito no coração. Tudo à minha volta me fala de ti. Está escrito em toda a parte que tem de ser para toda a vida, que nós somos sem tempo em todas as dimensões. Este nós em que crescemos cada vez mais uma é um estado de existência superior. Porque crescemos para além de um 'eu' e aprendemos a melhor parte de nós. Porque nos cumprimos, partilhando. Porque o ser é mais inteiro por ser capaz de integrar o outro e renascer nessa união. O Amor para toda vida é capacidade de nos reaprendermos uma na outra num nós forte e adulto. A minha vida é hoje infinitamente mais rica pelo que te aprendo e o que dou de mim. Eu e tu somos em tudo mais porque amamos e sabemos a importância do Amor. Está escrito na terra inteira que tu e eu somos um lugar infinito, um caminho único, um universo por descobrir. Debaixo da minha pele o nós é imortal.

sábado, 15 de novembro de 2008

Cá em cima

Jakob Ehrensvärd, Windows of the past Series,2008

Lá fora, as horas avançam de um lado para o outro e ignoram-nos. Espreitamos cá de cima o que não nos apetece e ficamos coladas à janela ausentes do tempo que, lá fora, não é nosso. Aqui, onde nós estamos, o tempo é História - a nossa era, passado, presente e futuro. Por debaixo da janela, na rua, onde as horas correm apressadas, as pessoas vivem indiferentes a esta ideia de imortalidade. Tu e eu sentimos e vivemos uma outra dimensão, onde a medida de tempo é o ritmo cardíaco do teu toque na minha pele, do teu beijo no meu coração. E nesta eternidade de sentidos em que nos concebo, nada nos interrompe. Nesta História heróica e exemplar vivemos muitos anos, ontem, hoje e depois disso. Tu e eu somos o espaço e o tempo do Amor - indiferente à vida e à morte, absoluto e incondicional. Para além do Amor, não há matéria nem outro tipo de partículas - só vazio, escuridão, o nada.

domingo, 9 de novembro de 2008

Am(arte)

Sharon Rrogers, Lace, 2006

Haverá arte maior do que o rendilhado do Amor? Porque a malha que o tece exige-nos uma inegualável disponibilidade e porque somos absolutos e verdadeiros para nós mesmos quando amamos. Se te sinto de forma plena nada me faz desistir da parte que és em mim, porque sem ti não sou eu, sou apenas um estado de existência transitório. Amar-te é ser mais do que apenas eu, é acreditar que tenho um sentido e que me cumpro na arte de viver. Porque o Amor é vida e o contrário é morrer. Sem ti cuidei que morria e morri todos os dias e todos os dias sobrevivi porque acreditava que eras tu a minha vida e que, um dia, me voltarias. Porque, apesar da dor do longe e da distância, acreditei em nós, porque o Amor vivia em mim e sempre soube que em ti também. Haverá maior arte do que esta que me esculpe, no coração, o teu nome?

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Mistério

John Lamb, A small place in the country

Assim, no meio de uma paisagem aberta ao infinito, visto-me de céu e saboreio o vento que me empurra. Tenho a sorte de reparar na brisa e nos diferentes tons de azul que me espreitam lá de cima. O espaço que ocupo é pouco mais do que o meu tamanho e, por pouco que seja, não preciso de mais porque não sou mais do que eu mesma, logo dispenso o excesso ao qual não serei capaz de dar uso. A dimensão das coisas é a grandeza da vida interior que as habita e não o que a física torna lei. Do tudo ao nada vão muitas vidas num só tempo, vidas de nada e vidas de tudo. A existência perfeita é aquela em que coincidimos no que somos com o que os outros nos reconhecem. É difícil, senão impossível - somos múltiplos em nós mesmos e nos outros uma imagem apenas. Numa paisagem deserta, embrulhada de vento, tudo parece mais simples e inteligível.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

A fragilidade das horas

Jakob Ehrensvärd, More glass crushing, 2005

A fragilidade dos dias é vivida hora a hora, segundo após segundo. De um momento para o outro a luz pode tornar-se noite escura, impossível de navegar e, por vezes, definitiva. E nem sempre nos damos conta deste estado de fraqueza que é passar pelo tempo sem perceber que os dias passam sem retorno. Esbanjamos o que não é nosso, deitamos a perder o que jamais conseguiremos ganhar. De uma hora para a outra perdemos tempo de vida a pensar que temos uma vida cheia e adormecemos indiferentes à contagem decrescente que, irremediavelmente, caminhamos. Consumimos tempo por tudo e por nada menos pelo que é essencial. Ou porque achamos que os dias não têm fim ou porque não sabemos o que é importante. Passamos pela vida sem cuidar do jardim cujo o verde primavera, um dia, terá fim. Não chegaremos a tempo de salvar coisa nenhuma se não soubermos a medida exacta de cada segundo que respiramos.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Do lado de fora, o Inverno

John Lamb, Gathering Storm

Agora que o Inverno se aproxima da cidade onde tu e eu somos uma, dou-me conta que esta é a primeira estação fria que passamos em nossa casa. As minhas mãos frias nas tuas, tão geladas quanto as minhas, encontram debaixo da tua pele um verão tão longo quanto o Amor que nos embrulha indiferente às estações e à mudança de cor da paisagem. O tempo frio e as tempestades são meros intervalos que nos engrandecem o aconchego de um nós sempre quente e pulsante como a vida que anima as montanhas de fogo. Em nossa casa há mantas quentes em cada corredor da alma e no quarto abraça-nos um sol permanente como o centro de luz que organiza galáxias e dá forma ao Universo. O frio não nos chega, o calor que vem de dentro retem o Inverno à porta de casa. O Amor embrulha o teu corpo quente no meu e quando adormecemos sonhamos com a luz intensa que nos abraça o passado, o presente e os dias por vir.

sábado, 1 de novembro de 2008

Things to remember

Ricardo Alves, Seascapes of Portugal (Praia da Adraga), 2008

"...Love Anything
Use a metaphor and tell us that your lover is the sky
Sometimes
Sometimes nothing often means the beauty of the human experience
These things are to be remembered
To be remembered"
PETER MURPHY, "Things to remember"
_______________________________
Lá estaremos no Coliseu, hoje à noite, para lembrar com o mesmo prazer de sempre...

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

Ao relento

Douglas Allchin, Branches totally encased, 2007

Hoje senti frio a caminhar pelo dia soalheiro que nos amanheceu. Senti o frio de não te encontrar nos meus olhos durante o intervalo que deixámos por fazer. E o dia foi passando por mim a reclamar por atenção, indiferente ao frio instalado debaixo da pele que só aquece ao pé de ti. Agora que as horas mudaram e é quase noite sem o ser aqueço as mãos uma na outra, para que o sangue me regresse nesta pressa que tenho de chegar-te a casa. E tu, que corres mais depressa contra o tempo que não te sobra e estarás à minha espera, poderás reparar no arrepio dos dias sem ti, que disfarço no calor destes braços urgentes para te aconchegar. O meu abraço queima da impaciência que o dia me acrescentou. Se as palavras falham tantas vezes a eloquência de te fazer saber o que sinto, os braços que te abraçam têm a força de ontem e a confirmação de amanhã. Hoje celebro a certeza de que é em ti que quero morar em todas as estações do ano.

domingo, 26 de outubro de 2008

Segundo a segundo

Sheila Smart; Dali's clock with second clock, 2002

A vida é a soma das horas e do que deixamos construido nelas. Depois do fim dos dias, seremos apenas o que deixarmos ficar da nossa presença no tempo que percorremos dentro e fora de nós. Nada acontece sem consequências, tudo é um princípio um meio e um fim. Cada gesto, cada palavra contam, fazem a diferença de um antes e um depois na distância que vai daqui a ali. A vida é esse contra-o-tempo em que corremos todos os dias de olhos fixos no relógio. Por vezes, perdemos tempo e envelhecemos nessa inconsciência. E quando damos por isso é tarde demais para regressar ao ponto útil das coisas, porque o momento certo não se repete, é único e quando acontece é nossa missão fâze-lo durar para toda a vida. Sensatez e sabedoria é perceber que o tempo que dispomos, que é tão pouco para o tanto por fazer, é valioso em cada segundo.

sábado, 25 de outubro de 2008

Escada

Zenmatt, Stairs, 2006

Subimos e descemos quilómetros de vida. Aqui e ali paramos e depois continuamos, nem sempre descansamos. Subimos e, por vezes, caímos. Descemos e, por vezes, escorregamos. Por vezes magoamo-nos e magoamos. Subimos e descemos quilómetros de incerto, de corpo tremido pela dor dos estilhaços da queda. Subimos e descemos em círculos e partimos e chegamos ao mesmo sítio incansavelmente. O caminho é uma escada em caracol, porque a vida não é uma recta. São montanhas e planícies que nos olham de frente como desafios à grandeza da alma.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Sem igual

Lawrence Ripsher, New Home, 2006

Sabes o que é tão único como o inexplicável do Amor? É encontrar em cada beijo teu uma nova casa com a dimensão de lar. Nos lábios que se queimam neste encontro de almas há uma transcendência que apenas alguns poderão testemunhar. Tenho a sorte de aprender contigo a vida e o que houver depois disso, se alguma coisa houver depois de nós. E se nada houver, viveremos em tudo o que ensinarmos agora. O que é urgente é este Amor infinito que torna caminhos de pedra em passadeiras de veludo. A minha pressa é apenas essa, percorrer-te passo a passo como um milagre que me faz maior por dentro e mais inteira pelo entendimento da verdadeira essência das coisas. E vejo-te crescer como eu e repouso nessa tranquilidade de quem tem a mesma terra debaixo dos pés. Sabes por que é, afinal, tão único e inexplicável o Amor? Porque nos abraçámos por debaixo da pele contra todos os improváveis. Que outra coisa existirá com a mesma força de infinito?

sábado, 18 de outubro de 2008

Noite e dia

Zenmatt, Wrong channel, 2008

Porque queremos tudo ao mesmo tempo e desejamos infinitamente o que não conseguimos ter no mesmo momento. Porque inventamos caminhos e pintamos de nós o céu e a terra por onde viajamos. Porque procuramos canções em que a rima vem de dentro e não da forma arrumada das palavras. Porque acreditamos uma na outra mesmo quando o que dizemos, desastradas, não faz muito sentido. Porque sabemos que não há vida sem nós porque tu e eu somos uma. Porque sentimos para além da pele a aflição da ausência e sabemos que sem nós morremos. Porque a vida só é vida quando o sonho existe. Porque vivo um sonho. Porque tu existes, porque te encontrei. Porque nos temos. Para sempre e mais um dia. Sweet dreams are made of this...

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

Alimento

Jakob Ehrensvärd, Ice and water, 2004

porque sim, porque és tudo, porque te prometi e
amar-te é ter a ousadia de acreditar na eternidade
para além de nós nada existe
amar-te é caminhar inteira,
mais segura e mais verdadeira,
e encontrar-me e cumprir-me de corpo e alma

domingo, 12 de outubro de 2008

Quinta Dimensão

Jakob Ehrensvärd, Stockholm Gloom, 2005

Olho à minha volta e para dentro também. Observo as marcas, os rasgos na paisagem que vai mudando na sucessão dos dias. Tudo acontece naturalmente como uma queda de água durante o degelo que anuncia a Primavera. Tudo é tão inevitável, tão cheio e dramático também. À minha volta observo objectos envelhecidos e todas as outras coisas que, a seu tempo, chegarão ao fim maltratadas pela inevitabilidade dos anos que passam. O tempo envelhece por fora mas nem sempre por dentro, nem sempre nós e o tempo que nos assiste caminhamos em simultâneo. Nós, por exemplo, respiramos à margem do tempo e vivemos para além dele. Nós, por exemplo, rejuvenescemos por dentro ao cumprir cada beijo que nos falta dar, porque te devo, e tu a mim, todos os beijos que não demos antes de nos encontrarmos. Nós, por exemplo, abraçamos o Amor como se os dias tivessem pouca importância na força do abraço que é sempre mais intenso e mais demorado, imenso. Nós, por exemplo, não somos o tempo, somos a força de vontade contra a qual o tempo nada pode. Porque queremos passado, presente e futuro tudo na mesma hora, porque o que nos habita não é tridimensional. O Amor é a nossa dimensão de corpo e matéria sem fim.

sábado, 4 de outubro de 2008

Toda a vida

Katie Jones, 5th January 08

Se 'para-toda-a-vida' fosse uma paisagem, eu seria o farol a abraçar-te o caminho, a olhar-te por ti incansavelmente, da noite escura às manhãs cheias de sol, através do nevoeiro ou da transparência dos dias de cristal, sempre no mesmo sítio de porto seguro, de terra firme onde podes descansar confiante de que o nosso abraço vale a eternidade. Sou essa vontade de horizonte sem fim, de braços estendidos para um nós cada vez mais além, forte e infinito como tudo o que nos prometemos com absoluta certeza do que sentimos. Se 'para-toda-a-vida' fosse o instante de beijo apaixonado, eu beijar-te-ia com o desejo de quem te descobre os lábios pela primeira e última vez, como se não houvesse mais dias a não ser o momento exacto em que duas almas se encontram e se fundem num único corpo. O que tenho como certo é que 'para-toda-a-vida' é hoje e o que sabemos ser hoje, o que aprendemos agora, o que damos de nós livremente e recebemos com a mesma vontade. Vivemos no encadeado dos dias, sei que o resto da minha vida é feito de hoje e, hoje, eu aposto tudo.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Inexistência

Barbara Heide, Wet Colours, 2008

Se o mundo, amanhã, chegasse ao fim teria pena, muita pena, pelo tempo que não tive contigo, pelo tempo que não nos sobrou, pelo tempo que tardámos desencontradas. Este tudo que tenho em nós me parece sempre pouco, porque o Amor não tem medida e nada esgota a vontade de mais longe e mais além, de mais caminho, mais luz e mais céu e terra ao mesmo tempo. A imensidão que me embrulha em ti não tem fim, porque não tem princípio senão na essência do que sou, de tudo quanto me começa e me acaba. Sem ti não seria eu, porque eu sou aquilo que sinto e me define e este tanto que te quero e que me faz sentir vida é a minha própria certeza de existir. O Amor é tudo o que vale a pena, o resto são formas de enganar o vazio de quem se procura sem se encontrar. O Amor dá-nos a certeza de um lugar próprio e um sentido que nos cumpre e nos completa. Eu-sem-ti é uma vida impossível, porque não há vida para além de nós. Sem ti, só imagino a inexistência.

domingo, 28 de setembro de 2008

Lembra-te...

Barbara Heide, Rust Series, 2007

A nossa casa, sem pedra nem ferro, tem a força das árvores que rompem o chão, debaixo para cima, num abraço a tocar o céu cada vez mais alto e aberto. A nossa casa é feita de um querer segurar e por a salvo todas as pequenas e grandes coisas que embrulhamos no tempo e nas recordações que coleccionamos. E enquanto escrevo, recordo o que, ontem à noite, te embalei ao ouvido: deixa-me abraçar-te com a imponência da vontade que o Amor fortalece e nunca põe em causa. Quero abraçar-te e passar o resto da minha vida a tornar mais alto e mais aberto este abraço permanente e este querer-te sem medida. Ainda que nem sempre me acredites as palavras, a verdade vem de dentro e o que escrevo vem do centro da alma que não sabe mentir nem inventar com talento suficiente o que o coração sente simplesmente. Assim te sinto eu, sempre infinita no ar que me mantém viva. E porque te encontro em toda a parte em mim, sinto que a nossa casa é feita da vida que, ambas, desejamos e acreditamos sem fim.

sábado, 27 de setembro de 2008

Algures


Adalberto Tiburzi, Looking East, 2005

Há dias em que tenho dificuldade em acordar. E não acordo. Passo pelo dia sem abrir os olhos, lenta e inconsistente, sem que as horas, as coisas e as pessoas cheguem a dar por mim. Há dias que acordam a minha indisponibilidade e, por mais que eu tente arrastar-me para fora desse quarto perdido dentro da minha cabeça, não depende de mim mas de uma chave nem sempre combinada com a fechadura. E os meus olhos fechados, ainda que reconheçam o ruído de um relógio que me dá notícias do mundo lá fora, revestem-me o corpo de uma invisibilidade necessária, que me protege da não-presença das coisas e das pessoas como eu as imagino. Porque, às vezes, só existem as horas e, nelas, imagens que não nos abraçam e nem reparam nós.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

De fora para dentro

Ray Petit, No Exit (Anxiety Series), 2005

Adormeço à beira de uma janela de fora para dentro e, enquanto me sossega a alma, revisito o tempo de dentro para fora como quem percorre de memória paisagens que só existem na nossa cabeça e só de vez em quando. Adormeço à procura de sono, debruçada nessa janela onde a luz não falta, mesmo à noite quando a terra vira costas ao centro feito de fogo. Restam-me alguns minutos de conversa interior antes de vaguear, por onde ainda nem imagino, no sonho de daqui a bocado. E encontro-te a ti, aqui e ali, em todo o lado. Sei-te a dormir, por isso falo devagarinho e faço barulho baixinho e corro o risco de te acordar. A noite dá-me o tempo que o dia te retira e teimo em ficar assim, à janela, a imaginar que, debruçada nela, me sonhas um mundo cheio de nós e que, depois, entre o eu acordada e o teu a dormir, há uma ponte de beijos que atravessamos sem chegarmos a margem nenhuma, de um lado ou do outro. Porque não há margens quando concordamos que o Amor é uma passagem infinita. Debaixo da minha janela, imagino-nos um mar alto esticado até ao céu, num azul único feito da mesma luz da meia noite ao meio dia. Daqui, da minha janela de onde, de fora, espreita o sono, só lamento as horas que se perdem sem nós. Beijo-te não tarda nada...

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

E se depois?

Lawrence Ripsher, This Forgotten Place, 2006

E se depois? Quantas vezes nos refugiamos na pergunta à qual não podemos responder, pelo simples facto de não haver resposta no momento em que nos ocorre perguntar. Não sei, nunca soube, responder ao que se espera de um 'E se depois?'. E o que é que isso interessa agora? Muito pouco, quase nada. Vejo-te suspensa naquilo que se vai passar daqui a bocadinho e só me apetece sossegar-te, porque, mesmo que nada aconteça, mesmo que permaneças no mesmo sítio depois de uma longa espera, vai correr tudo bem. Sabes porquê, meu amor? Talvez não saibas, mas eu sei. Porque continuas igual a ti, intacta, inteira. Porque continuas tudo o que sempre foste e mais ainda pela experiência que os dias te acrescentam. Porque esse tudo é incorruptível e isso é uma vitória. Porque o teu caminho é tudo o que sabes construir num universo maior que transcende o mundo dos outros. Porque vales mais do que eles conseguem perceber e não podemos torná-los mais espertos do que a imperfeita humanidade que lhes assiste. E se depois de tudo eu pudesse escolher, serias tu, sempre única e incontornável. E depois disso serias ainda a minha razão de sentir o infinito.

segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Repetição

Adalberto Tiburzi, La Luce di Eraclito, 2006

Deixa-me dizer-te outra vez o que te digo todos os dias quase por necessidade primeira: tenho esta certeza infinita que, de tão certa, me parece imbatível. Tenho a certeza que a forma como, debaixo da pele, te sinto fluir como sangue eterno é tão absoluta em mim que passou a ser a medida de todas as coisas visíveis e invisíveis, como se nada mais tivesse valor porque nada mais existe para lá do que me habitas. Por vezes, fico a pensar no que te diria se, algum dia, te escrevesse uma carta de amor, e depois desisto. Não saberia dizer a certeza de sentir-te sempre antes, durante e depois de tudo certamente. E, por mais que tentasse, falharia em descrever um coração que te vive e revive constantemente na absoluta certeza de que viveremos para sempre. Por isso, deixa repetir-me vezes sem conta a dizer-te, todos os dias, este amor sem carta que te chega sem princípio, meio ou fim. Deixa-me dar-te conta assim desta luz que nenhuma noite escura apaga em mim.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Anos sem fim

TomTom... Sempre em frente...

Quando for amanhã, que é daqui a bocadinho para mim e hoje para ti, serás um bocadinho mais crescida e eu estarei à tua volta à espera de muitos amanhãs comigo, aninhada num único pensamento – que a vida nos seja eterna, que nunca te acabes, que vivas para sempre na minha vida e eu na tua e depois disso. Quando acordares o dia é teu – quero um sol infinito na tua mão e um abraço sem fim desde a ponta dos teus dedos até ao coração. Quero ser o resto da tua vida nos meus braços que serão sempre pequenos para te dar conta da imensidão que és em mim. Segura nos lábios um beijo meu desde a hora em que nasceste até ao fim dos dias.

domingo, 7 de setembro de 2008

Luz de dentro

Jeanne Newman, Postcards from lodz Series, 2004

Vamos misturar a luz ao encontro dos milhões de cores que ainda desconhecemos debaixo deste sol que nos descobrimos desde o primeiro momento. Anda brincar com a cor dessa luz da qual os nossos olhos, olhos nos olhos, não descansam. Anda fazer uma pintura com essa tinta que o Amor mistura num brilho que os braços embrulham como vida e eternidade. Vem cobrir as paredes e o chão, o tecto e também o céu de toda a nossa luz que nos segura, do mais claro ao escuro, nos mil tons de infinito. E quando anoitecer e estivermos um pouco cansadas e precisarmos de descansar, olha-me sempre com o mesmo sol que te vem de dentro e basta-me esse ponto de luz para continuar, porque é único, o mais luminoso e aquele que me dá sentido, a vida eterna em que acredito. Porque sem ti tudo é negro e fundo e à beira do fim do mundo.

sábado, 6 de setembro de 2008

Regresso a casa

Lawrence Ripsher, Double Parked, 2006

Devagar, tão lentamente quanto a ideia feliz de que os dias não têm medida porque começam e acabam em minutos precisos fora do relógio normal das horas, regresso a casa. Regresso ao tempo do mundo que deixámos adormecer e acordar sem nós, regresso à vida que fica do mesmo lado do espelho de toda a gente, ou de quase toda a gente porque há excepções à regra. Os dias e as noite quase mediterrânicos acabaram e deles já só resta a poeira do que conseguimos lembrar e sorrir no que recordamos. Mas é deste lado que nós somos por completo a vida. É deste lado que estamos sempre, mesmo quando distraimos das horas nos intervalos. Voltar a casa é voltar ao Sempre e voltar ao Sempre é acreditar no infinito para além da parede do quarto que é infinito como o Amor que nele acontece sem medida de tempo nem noção de espaço que não seja a escala do corpo, do coração e da alma. Voltar a casa é voltarmos completamente ao que é único e só nosso e encontrarmos o Sempre à nossa espera.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Ir e Voltar

Anabark, Na Parede (MAI07)

Vou, mas voltamos. Vou ao encontro do teu abraço que me espera há muitos milhões de dias, tantos que lhe perdi a conta. Finalmente parto para a chegada onde me esperas há mais de uma vida em tempo contado segundo a nossa medida. Vou agora e voltaremos as duas...
Boas férias...

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Ausência

Adalberto Tiburzi, Cat on a hot fiberglass roof, 1978

Voltei. Ou talvez apareci. Para voltar era preciso que tivesse partido. Não parti. Ninguèm volta ao lugar de onde nunca partiu. Este é um lugar de partida impossível. Às vezes demora com razão, outras vezes não, demoro simplesmente. Partir não parto. Estar ausente é uma demora prolongada apenas. De resto, tudo permanece no mesmo sítio. O Amor não parte nem tira férias. O Amor é o infinito daquilo que existo sem a mais leve demora.

domingo, 27 de julho de 2008

No centro do centro

Paul Smetsers, New York - I just arrived, 2006

Acabo de chegar, ou como quem diz acabo de acordar. Acabo de chegar de ti e acabo de voltar-te ao mesmo tempo. Do sonho, onde começamos o abraço, até ao despertar na manhã seguinte, sem descansar do beijo, vão muitas viagens que quase nunca recordamos pela pressa de acordar e sentir o corpo no corpo tal como adormecemos. E todas as noites passadas são viagens ao centro de nós, ao centro da terra que nós somos e à aventura que construímos hora à hora, desde o primeiro momento no tempo que passou até ao Sempre em que nos cumprir. São mil viagens de sonho e outras tantas de caminho percorrido. São mil formas de explicar o infinito ao mundo que acredita na improbabilidade de acontecermos para toda a vida. Viajamos pelo centro de tudo em vôos rasantes por dentro e por fora de nós. E todos os dias aprendo que o Sempre é a nossa viagem de fora para dentro, de encontro ao centro onde tudo começa, tudo nasce e nada se acaba, onde somos sem fim o princípio de tudo e tudo para além do explicável. A pele que nos sabe de cor num movimento único guarda o perfume da viagem onde tu e eu nos confundimos no centro do centro da vida. Pele da minha pele, sangue e alma única, és tu em tudo o que me anima.

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Transparência

MCsaba, 1st: Roundish Manifold, 2007

Tenho momentos de corpo e alma translúcidos que tu encontras e seguras docemente como quem adormece só depois do sono chegar primeiro a quem amamos. Tenho momentos de tão pura lucidez que só existes tu no que eu sou desde que a vida nos juntou num mesmo caminho. Tenho a lucidez de reconhecer que o Amor é o milagre da vida e que para além dele tudo é noite e morte anunciada. Do tanto que há para saber sei esse pouco que, em mim, é infinito. E quando te olho e me detenho no teu sorriso que se espalha pelo meu corpo, sei com toda a certeza que a vida é a tua presença em mim. Se todos os dias acordo e me lembro de respirar é porque te sei comigo abraçada na mesma intensidade. Temos sorte, temos o Amor em nossa casa, vivo e bem cuidado, que nos aninha os dias no veludo da eternidade.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Contra-relógio

Bart Aldrich, Clouds 2, 2007

Há dias que passam e que quase não vivemos porque o tempo se esvai nas horas que nos apressam para chegar a tempo à irrelevância das coisas e às coisas irrelevantes. E o cansaço que fica da corrida entre dois ou três lugares incertos e outros tantos não-lugares esgota-nos o corpo e deixa-nos sem fôlego a caminho do voltar a casa. Hoje corri o dia inteiro e acelerei o que pude para chegar ao fim do dia. Hoje, que mal dormi, apressei-me em tudo o que fiz num contra-relógio para te voltar. E cheguei-te num contratempo que nos atrasou sem querer o que é nosso. E neste compasso que nos atrasa o mundo que somos nós, deixamos que a noite nos descanse os músculos e nos repouse a alma numa espécie de baloiço feito de braços e do abraço em que nos temos sempre e em toda a parte. Estou cansada, mas sei que tu me embalas no teu corpo daqui a pouco. Estou cansada, mas não me faltam forças para te embrulhar, num beijo, um sono descansado. E assim se desfazem os nós dos dias apressados, nesta simplicidade reparadora que o Amor encerra quase de forma inexplicável.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Uma na outra

Zenmatt, Heart Ribbon, 2008

Deixa-me acordar-te todas as manhãs com a felicidade da primeira noite que vivemos numa só. Deixa-me dizer-te bom-dia com o mesmo sorriso que nos adormece o corpo depois de entretido, pele na pele, entre o suor e alma. Deixa-me abraçar-te a manhã com o aconchego de um corpo noutro adormecido. Deixa-me despertar no sabor dos beijos que, no ontem, deixamos suspensos só porque o sono nos venceu. Deixa-me encontrar-te todos os dias da mesma forma absoluta com que o coração me diz, minuto a minuto, que és tu para o resto da minha vida. Deixa-me ser para sempre a vida dos teus olhos e tu a alma da minha vida. Deixa-me sempre na boca esta vontade de mais, infinitamente.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Sobremesa

Andrea Aschedamini, Yellow & Metal

Sobre a mesa estás tu. Sobre o chão, sobre a terra, sobre as montanhas que a decoram, sobre tudo e sobretudo existes tu. Não me lembro de mais nada para além da forma como ocupas os meus pequenos grandes dias. Não me lembro de existir um mundo sem ti. Não sei sequer se é possível que o mundo tenha existido sem ti. Porque mesmo antes de existir um nós, havia em mim uma ideia, um conceito e a secreta esperança de que existisses fora da minha cabeça. Eu nunca vivi sem ti. Antes de me encontrares, vivi num intervalo de tempo, numa pausa feita da experiência necessária para saber reconhecer-te como o elo primordial do sentido que me segura à vida. Sobre a mesa estamos nós numa refeição que nunca nos satisfaz porque porque tudo nos sabe a pouco. E tudo tem o valor do infinito. Bom e mau faz parte da vida. Sou maior pelo que aprendo no que nos revelamos sobre a mesa. Bom e mau, somos inteiras e nada pela metade. Não quero nenhum paraíso artifícial, quero o bolo todo e as migalhas que sobrarem. Quero-te a ti completamente, nem mais nem menos. Quero-nos condenadas pelo pecado de sermos livremente a imperfeição humana que, todos os dias, nos apaixona incondicionalmente. Quero-te como a sobremesa da vida na vida de todos os dias, assim, tão única quanto um ingrediente mágico e secreto, que vale a eternidade.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

A caminho de casa

Zenmatt, Mimicry, 2008

Quando, porque estamos longe, o Tempo pára na pressa de voltar a casa, invento horas que passam a correr e coisas que aconteçam mais depressa do que é possível acompanhar. E as horas não passam, pesam-me nos olhos e nos gestos, e teimam em ficar. E assim, lentamente, eu espero e me faço esperar. Aqui e aí são pontos de partida e de chegada onde, suspensas, aguardamos em passo apressado. Por vezes, invento-nos num jardim onde nos encontramos para descansar esta pressa absoluta de não nos chegarmos tarde nas horas. A urgência de nós é o ritmo cardíaco que nos anima e nos atravessa do coração à alma. Quanto tempo tem um segundo longe de ti?... Anos, eternidades.

quarta-feira, 9 de julho de 2008

O mundo na mão

Zenmatt, Turn, 2006

As voltas que o mundo deu para te encontrar foram tantas, tantas que cada beijo teu sabe-me ao desejo infinito de que são feitas as paixões maiores que o Tempo com que o Amor nos embrulha corpo e alma. Antes de me chegares, andei e caí muitas vezes, cuidei que corria e que avançava. Mas não. Derivava em círculos, tropeçava e nem sempre percebia os passos pelo caminho mal decorado. E um dia o mundo deu uma volta e fiquei de pernas para o ar. Tu existias no mesmo hemisfério e chegaste-me por fim. E tudo ao contrário parecia fazer sentido pela primeira vez em todas as vidas que tive antes de ti, talvez porque antes de ti não vivi, só passei pelo mundo de forma parada. Nas voltas que deste até mim passaram para ti outras tantas vidas. Hoje, que somos Uma desde a primeira hora, pouco importa o Tempo, porque o Amor é feito de uma certeza que nos transcende em múltiplas dimensões. Hoje o mundo é do nosso tamanho e as voltas que lhe damos têm a duração exacta do nosso abraço infinito.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Viagem a cores

Jeanne Newman, Postcards from Lodz Series, 2004

Todas as horas me sabem a ti e todas as horas que passam longe do nós que somos inseparável me parecem viagens infinitas e desertas de cor. Porque a vida que descubro neste estar contigo é vida plena de alma. Quando viajo sozinha corro para te chegar porque em qualquer parte do mundo ou canto do universo tenho um único destino: tu. Não descubro nem contemplo paisagens pelo caminho, porque não há paisagem onde tu não estás comigo. Não me distraio a olhar o que não posso partilhar contigo nem perco tempo à procura de postais. Não reconheço cor na fotografia onde não te encontro. Onde não me partilho contigo não há luz. Este estado de emergência de viver-te sempre mais é uma missão sem retorno, uma forma de vida absoluta, porque viver é partilhar e encontrarmo-nos no que temos para dar e receber a toda a hora. Aprendo mais de mim no que me descobres em nós e no nós que construimos vou coleccionando partes de ti, umas que me ensinas, outras que vou desvendando na paisagem que compomos nos tons do que sentimos por debaixo da pele. De nós vem uma luz diferente que não brilhava antes isoladamente. Do nós reflectem cores e possibilidades infinitas de desenhar paisagens, mudando as montanhas de lugar. Se nós quisermos conseguimos ser imortais.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Antes de ti

Bill Warren, Building in red clay Series


Antes do Amor acontecer na sua vida coleccionava os dias coomo puzzles à espera de solução invariavelmente adiada para o dia seguinte. À noite, de regresso a casa, punha de lado os sacos pesados das horas trabalhadas sem minutos vazios e a roupa usada no corpo como papel de embrulho da intermitência da alma e instalava-se, confortável, no sossego das horas de nada. Frequentemente procurava o mesmo cd para lhe fazer companhia. O piano e o suave compasso da melodia dos Rachel's percorriam, insidiosamente, a sala transformada numa nuvem de sons contemplativos que ficavam à espreita. Mergulhada em si mesma, deixava-se observar pelos sons, enquanto pensava os dias como ficheiros temporários de vida, sem pormenores de grande importância, ausentes do essencial. Ficheiros temporários com a validade de 24 horas, facilmente descartáveis sob uma imaginária tecla de 'delete'. E os dias passavam, substituindo-se automaticamente. E a vida passava sem vida. Viver não seria apenas esconder-se atrás dos dias e da força das circunstâncias. Quando o Amor aconteceu descobriu o princípio, o meio e o fim de tudo, a grande razão de Ser para além do existir simplesmente. E, desde então, sorri naturalmente e todas as noites adormece aninhada na música que o coração lhe escreve na pauta dos dias maiores do que a vida e para além da eternidade.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

As ondas de um copo água

Charles Rettner, Liquid Ice

E as tempestades de que, às vezes, escrevo, são ondas num copo de água. São feitas de vento e de vontade de ser tudo mais e sempre melhor. São tempestades em que as agulhas de chuva são faíscas de Amor em lume, num incêndio permanente. São quase nada e tudo na mesma hora. São um querer desesperado porque impaciente. As tempestades que nos acordam numa côr diferente são a força de nos querermos mais do que nos podemos imaginar. As tempestades que nos agitam momentos nem por isso inteligentes são a intensidade que nos segura o abraço em que sempre adormecemos. A tempestade só é tempestade quando não percebemos que somos maiores do que o mar insignificante que acontece num copo de água agitado. Porque somos um universo sem princípio nem fim. Se somos mar que sejamos sempre sem limites o beijo que nos navega infinitamente corpo, alma e coração.

sábado, 28 de junho de 2008

Intervalos de chuva

Zenmatt, A Hard Rain Is Gonna Fall, 2007

Nem sempre o que brilha são estrelas, nem sempre o que dizemos é ouvido como foi dito à partida. Nem sempre reagimos com razão universal. Nem sempre pensamos ao encontro do outro. Nem sempre nos encontramos à mesma distância. Nem sempre sabemos o que pensar. Nem sempre percebemos o que nos querem dizer. Nem sempre estamos no mesmo sítio na altura certa. Nem sempre estamos de olhos abertos atentos a tudo como gostaríamos. Nem sempre acertamos. Falhamos e nem sempre comprendemos como. Falhamos. Conheço a culpa do que digo com intenção e a impotência perante uma má interpretação. Sei de cor a minha culpa nas coisas que digo pensadamente. E sei também as coisas que digo por dizer sem prejuizo intencional. Falho de ambas as maneiras, como quem não sabe dizer sem magoar e magoar-se. Um dia saberei interpretar tempestades e andar por entre os intervalos da chuva. Um dia serei capaz de evitar as poças de água de um lado e do outro do nosso caminho. O meu coração continua no mesmo sítio, abraçado a ti.