Outros eram os tempos em que corria um vento a mar por cima do desejo de encontrar a vida. Não sabia ao certo o que fazer depois de tanto tempo à espera, devagar. Sentia o medo apoderar-se dos braços e não era cobardia pensar que não resistiria para além do tempo absoluto de um instante. O próximo. Na boca engolia a vontade de gritar, a voz perdia-se no próprio corpo. Se chegasse a noite profunda, enrolar-se-ia por detrás do terror, discretamente até adormecer de vez.
O barulho da tempestade em alto mar soltava demónios invisíveis que tornavam a noite numa escuridão sem volta. Os olhos anteviam o pior, a alma sobrevivia a custo. A luz chegava de repente como um fim de mundo aos poucos, sem consequências para além de um coração suspenso na garganta por fracções de segundo que duram eternidades. E outra vez o barulho de mil mundos em fúria entre o céu e o mar. Nunca o inferno pareceu tão verdadeiro. Nunca tinha respirado tantas vezes seguidas como se a próxima fosse a última, numa agonia que rangia em uníssono com a madeira molhada do barco, que perdia o norte e se perdia aos poucos, desfeito, engolido pelo mar.
O longe estava ali, na incerteza de viver para além do desespero de uma luta em vão. Morrer cada vez mais sem soluções, empurrado pela discórdia entre o vento e as ondas de um mar gigante e negro. O longe era agora, tão perto de coisa nenhuma. Esvaziava-se a alma na vertigem de uma contagem decrescente, sem princípio nem fim. E uma alma vaga pouco pode lutar. Aos poucos perdia-se a vida e com ela o medo que assegura a sobrevivência à beira do abismo. Tornava-se difícil acreditar que a noite tem um fim e que o dia rompe em cada manhã, indiferente à escuridão da noite que o precede.
Os olhos habituavam-se agora ao negro entre o céu e a terra e sobravam na alma pensamentos incoerentes pendurados numa intermitência melódica de memórias. Passado, presente e futuro fundidos num só, num compasso rápido e dissonante como a deriva do navio maltratado e condenado ao fundo do mar. Faltavam as forças e ar para respirar debaixo de água. O desespero que, há pouco, era tão cheio de vida, sucumbiu sob um barulho ensurdecedor e depois disso, a sensação de uma vertigem sem fim numa calma de morte. A viagem afogava-se num turbilhão de despojos de vida e madeira, enrolados em água uns de encontro aos outros. Senti o corpo abandonar-me quando fechei os olhos. Não voltei a abri-los.
O barulho da tempestade em alto mar soltava demónios invisíveis que tornavam a noite numa escuridão sem volta. Os olhos anteviam o pior, a alma sobrevivia a custo. A luz chegava de repente como um fim de mundo aos poucos, sem consequências para além de um coração suspenso na garganta por fracções de segundo que duram eternidades. E outra vez o barulho de mil mundos em fúria entre o céu e o mar. Nunca o inferno pareceu tão verdadeiro. Nunca tinha respirado tantas vezes seguidas como se a próxima fosse a última, numa agonia que rangia em uníssono com a madeira molhada do barco, que perdia o norte e se perdia aos poucos, desfeito, engolido pelo mar.
O longe estava ali, na incerteza de viver para além do desespero de uma luta em vão. Morrer cada vez mais sem soluções, empurrado pela discórdia entre o vento e as ondas de um mar gigante e negro. O longe era agora, tão perto de coisa nenhuma. Esvaziava-se a alma na vertigem de uma contagem decrescente, sem princípio nem fim. E uma alma vaga pouco pode lutar. Aos poucos perdia-se a vida e com ela o medo que assegura a sobrevivência à beira do abismo. Tornava-se difícil acreditar que a noite tem um fim e que o dia rompe em cada manhã, indiferente à escuridão da noite que o precede.
Os olhos habituavam-se agora ao negro entre o céu e a terra e sobravam na alma pensamentos incoerentes pendurados numa intermitência melódica de memórias. Passado, presente e futuro fundidos num só, num compasso rápido e dissonante como a deriva do navio maltratado e condenado ao fundo do mar. Faltavam as forças e ar para respirar debaixo de água. O desespero que, há pouco, era tão cheio de vida, sucumbiu sob um barulho ensurdecedor e depois disso, a sensação de uma vertigem sem fim numa calma de morte. A viagem afogava-se num turbilhão de despojos de vida e madeira, enrolados em água uns de encontro aos outros. Senti o corpo abandonar-me quando fechei os olhos. Não voltei a abri-los.
Não sei onde estou. Não sinto nem frio nem calor. Sinto um movimento descendente e uma vaga impressão de consistência. Navega-me uma calma involuntária e irresistível. Não me lembro de nada e deixo-me ir na escuridão do veludo negro e opaco que me embrulha os sentidos. Não paro de cair e estranho. Sei que deixei de existir, mas continuo a ir ao fundo na perpétua incerteza de encontrar o chão.
3 comentários:
Que texto bonito.
Eu, por vezes faço da falta de chão só uma pequenina falta de gravidade. Com piruetas nos pés.
Nem sempre é assim, quase simples.
Abraço
Já agora, o chão, é preciso?
Mais uma vez, obrigado pela atenção e pela pertinência do comentário.
Relativizar é preciso, é verdade. Flutuar é um exercício de abstracção, sobretudo.
O chão torna-se necessário para descansar os pés, por breves instantes que seja. A questão central é a perpétua incerteza de encontrar o chão - se não houver chão não há queda.
Um abraço.
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