terça-feira, 24 de outubro de 2006

Passar por nós


Anabark - Ausências (MAI05)

Por cada vez que o Sol passa ao largo, ficas mais perto de saber se o mar ainda te pede para ficar. É possível que não saibas o que fazer, mas também não queres que o tempo permita tal consciência. Sabes, com certeza, que o tempo diz pouco a quem espera. Entre o estares aí e o meu aqui há um espaço infinito que se preenche alietoriamente, sempre acreditando que a alma vive no coração. Até que ponto vivo na tua cabeça? Se ao menos tivessemos um pouco da sorte dos marinheiros – partir e voltar para voltar a partir, sem nada e nada levar a não ser esta vontade grande de estar sempre longe, além, fora de tempo, a desejar voltar...

Houve tempos em que poder dizer algo era uma forma de estar perto de alguém. É estranho como 'algo' e 'alguém' soam próximos quando, na verdade, nem sempre coincidem. Quantas vezes 'algo' acontece e não fica no 'alguém' em quem gostaríamos que ficasse. Não que isso fosse uma consequência natural das coisas, mas por ser a nossa vontade, a nossa forma de representar um gosto, um desejo de vida. Egoísmo apenas. Não é suficiente encontrar uma porta aberta, é preciso saber fechá-la também.

Sabes quantas palavras tem uma língua viva? Eu também não. Tantas quantas aquelas que nos forem necessárias para existir e não apenas sobreviver. É preciso esbanjar as que temos, partilhar as que conhecemos e criar uma terra de ninguém com a nossa generosidade, passear para lá de todos os dias à procura do que existe ainda muito timidamente por enquanto. Quantas palavras faltam ainda inventar? Todas as que passaram por nós quase a pedir licença mais aquelas que ainda nem sentido têm nem se sabe se alguma vez terão. Não te parece tão pouco?
Se alguma vez pensaste que o chão que pisas existe, de facto, debaixo dos teus pés, certamente pensavas distraída, caso contrário terias perdido o equilíbrio. Não faria sentido de outra forma. Confirmar o óbvio não é perda de tempo, é um luxo dos distraídos, porque os outros sabem do risco que é tropeçar no inquestionável. Estamos longe de ser perfeitos. Tu estás aí. Eu nunca mais chego. Não estou atrasada, porque não combinámos nada. Tu não estás imóvel só porque não passas do mesmo sítio. Eu vou andando sem chegar, tu permanecerás, sem vascilar. Eu espero, tu esperas. Não sei quando passarei por ti, nem sei se tu me reconhecerás quando passar. Sei, apenas, contar-te esta nossa existência imperfeita, inacabada. Uma ideia de partida, um retrato de chegada. Alguma vez te falei da errância como castigo do que nos ensinaram e, teimosamente, não quisemos aprender? Melhor do que ninguém percebes o que quero dizer... certamente que sim!

6 comentários:

Sandra Marques Augusto disse...

E viva o Descartes, e o Kant, e o Hegel, e o Kierkegaard e todos os bichos-do-mato, que sem eles não conseguiria distinguir este prolegónemo da metafísica!

Caneco!, continua assim e não tarda nada estou c-o-m-p-l-e-t-a-m-e-n-t-e apaixonada por ti!!

Estás recordada de que o Sol é uma estrela? Pequenina para o resto do universo(s), mas enorme para a nossa galáxia. É a chamada "teoria da relatividade" (será?).
Kisses

S.Star

Always disse...

Ohhh, pensei que já estivesses t-o-t-a-l-m-e-n-t-e apaixonada por mim!

O Sol é a nossa estrela e a nossa galáxia é bem maior que o resto do universo(s). :)

Um beijo

Sandra Marques Augusto disse...

E estou...
Gosto é de pensar que ainda falta o "completamente" e o "totalmente" para que a sedução perdure: ora agora seduzes tu, ora agora sou.

Se para o Spinoza a essência do homem é o apetite, para mim é a sedução (afinal, não nos podemos comer uns aos outros logo à primeira vista!!).

Eu queria citar Oscar Wilde, mas assim de repente do que me lembro não se adequa... não faz mal, o que importa é que ele disse qualquer coisa e eu concordo, prontinho-da-silva.

Ai love iu
S. Star

Always disse...

Fico mais descansada assim.
A sedução deve ser um acto contínuo sob a forma de uma espiral.

De Oscar Wilde lembrei-me agora desta, ainda que só indirectamente venha a propósito:

The only way to get rid of a temptation is to yield to it. Resist it, and your soul grows sick with longing for the things it has forbidden to itself.

Luv u2!

Sandra Marques Augusto disse...

Tem graça, eu lembrei-me justamente dessa! :)))

Porque tu és, sem uma sombra na dúvida, uma tentação :+

SS

Always disse...

E tu, indiscutivelmente, uma sedutora! :)

Um beijo!